domingo, 29 de setembro de 2013

Bourdieu e a sociologia como "arma de combate"

No semestre passado a professora solicitou a leitura do texto “A Escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura” de Pierre Bourdieu. Não conhecia tal autor e me dispus a lê-lo como demandava a disciplina de Antropologia da Educação. Nem imaginava a mistura de sentimentos que tal leitura me causaria. 

Inicialmente fui tomada pelo sentimento da dúvida. Foi difícil entender as palavras do autor. Termos relacionados ao contexto sócio histórico da época se mostraram como os primeiros entraves desta leitura que tanto me desestabilizaria. Fiz a primeira leitura sem conseguir me apropriar das ideias do texto. Resolvi dar um passo para trás: reiniciar a leitura do texto buscando primeiro conhecer quem o escrevera. Para entender a essência das ideias que ali estavam sendo apresentadas precisava entender quem as desenvolvera. Precisava conhecer Pierre Bourdieu.

Busquei na internet inicialmente, e logo me deparei com o sociólogo francês Pierre Bourdieu, mencionado inúmeras vezes na rede. Optei por conhecer sua trajetória. Contradição, lutas, desestabilidade, revolta, negação, combate, ressignificação... Eram tantos os conceitos ligados à Bourdieu. Agreguei-os aos conceitos de capital cultural, êxito, fracasso e ideologia do dom que observara no texto e tudo começava a fazer sentido...ou melhor deixava de fazer sentido.

A partir deste momento a expressão “fazer sentido” norteou meu olhar e minhas conclusões. O que solidamente havia feito parte da minha trajetória de vida como verdade absoluta já não se mostrava tão verdadeiro assim...E todos os significados que atribuía aos percalços de minha trajetória não eram tão  verdadeiramente meus assim...Que confusão!

Pude através da observação da minha história, sob o olhar bourdieusiano, questionar-me sobre o papel da escola. Até então entendia, como muitos, esta instituição envolta em uma áurea sacra, salvadora de todos, uma resposta positiva àqueles que assim quisessem. E o papel do professor inserido neste contexto? Consciente ou inconsciente?
Questionar estas ideias socialmente construídas de forma tão concreta, observar as desigualdades sendo reproduzidas por todos (até por quem pensa que não as reproduz), ver os valores culturais como moeda de troca e de manutenção das diferenças, e nos enxergarmos partes integrantes e “atuantes” desta sociedade, nos causa inquietude e até um certo desespero.

Muitos sentimentos a partir daí floresceram: medo, indignação, negação, angústia... Aah!...clareza, ressignificação, conscientização... e mais dúvidas!
Fiz-me a seguinte pergunta: E agora? Afinal,  qual o papel do professor? Com a ajuda de Pierre Bourdieu estou dando um novo (e mais concreto) significado ao nosso papel, de professor, de aluno, de cidadão!... Não é um caminho fácil. É, muitas vezes, meio árido. Mas está valendo muito a pena.

Tenho a convicção que apenas avistei a “ponta do iceberg”. Quero conhecer mais... São tantos os conflitos e contradições que nos envolvem... Prefiro conhecê-los, questioná-los e me arriscar a entendê-los porque tal compreensão me levará a melhores escolhas... Esta foi a minha opção e caminho. E foi ela, sem dúvida, que me permitiu o encontro com vocês, como monitora da disciplina.

sábado, 28 de setembro de 2013

Recado da Professora:Vamos contribuir para melhorar o funcionamento do curso noturno de Pedagogia?




Caríssima(os),

Em discussão sobre a precariedade do funcionamento do curso de Pedagogia noturno, dentre vários problemas, alguns de vocês chamaram a atenção para o fenômeno das luzes dos corredores e pátio da cantina apagadas antes do final das aulas. Além de tal ação provocar um sentimento de desconforto semelhante àquele de observar os garçons colocarem as cadeiras sobre as mesas quando estamos ainda no meio da refeição… ela aumenta o sentimento de vulnerabilidade e insegurança. 

Combinamos que eu escreveria o esboço de um requerimento para apresentar à Diretoria da Faced. Copio abaixo para que vocês leiam e sugiram as mudanças que julgarem adequadas. Acho desnecessário que vocês assinem. Já que é algo que também me concerne, assinarei sozinha.




Ilma Sra. Professora Isabel Filgueiras
Diretora da Faculdade de Educação - UFC


Fortaleza, 30 de setembro de 2013
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Prezada Senhora,

Voltei a dar aula no curso noturno de Pedagogia no primeiro semestre deste ano e observei que, além da pressão dos alunos para sair mais cedo (em função da precariedade do transporte coletivo e da segurança pública na cidade), há uma pressão “institucional” nesse sentido. Tal pressão se manifesta de diversos modos: os serviços da cantina, da coordenação, dos departamentos e de xerox que encerram às 20 ou 20:30, mas particularmente constrangedor, aos meus olhos e dos alunos, é que por volta das 21 horas as luzes dos corredores e do pátio da cantina são apagadas.

Venho, portanto, pedir a Vossa Senhoria que investigue os fatos relacionados ao apagar antecipado das luzes e que tome providências no sentido de garantir que todas fiquem acesas até o última turma deixar o lugar.

Certa de que se esforçará para resolver o problema com a maior brevidade possível,

Agradeço antecipadamente,


Bernadete Beserra
Professora Associada do Departamento de Fundamentos da Educação

sábado, 21 de setembro de 2013

Escolhendo o tema da pesquisa etnográfica - O que e por que pesquisar?

Recebemos a tarefa de desenvolver durante o curso de Antropologia da Educação uma pesquisa etnográfica. Observar o nosso cotidiano na Faced sob a luz de um olhar antropológico nos traz questionamentos e  principalmente crescimento. Pensei muito sobre o que pesquisar e resolvi seguir os passos que as leituras, orientações e discussões sobre a etnografia, me sinalizavam.
Através do meu diário de campo pude observar situações no funcionamento da Faculdade de Educação que me causavam dúvidas e inquietações e comecei a formular hipóteses sobre elas. Chegar ao meu tema foi só o primeiro passo. A medida que as observações iam sendo feitas, registrava-as em meu caderno de campo e dirigia meu "olhar",complementando-o com o "ouvir"...(OLIVEIRA,2000). Novas hipóteses iam surgindo e constatações mais profundas iam sendo feitas. Observar e questionar a utilização de uma sistema acadêmico como o SIGAA, me fizeram enxergar problemas ainda mais complexos do funcionamento de nossa faculdade. Muitas constatações surgiram, e  as reflexões não se finalizaram com a última palavra escrita em minha pesquisa no semestre de 2013.1. Na verdade, as ideias e questões perduraram e se solidificaram, mostrando-me que as reflexões são infinitas, produzem conhecimento e são sempre bem vindas.

Ao conversarmos sobre as pesquisas que seriam desenvolvidas no semestre de 2013.2, mencionei a orientação da Professora Bernadete para que escrevêssemos como se estivéssemos contando uma história, com fluência...O diário de campo nos oferece muitos elementos e é fundamental para o pesquisador! Ao nos sentirmos mais à vontade para escrever, enriquecemos nossos registros, damos vida às nossas palavras. Assim percebi durante a elaboração do meu trabalho.

Como estamos na fase inicial da pesquisa, escolhendo o tema e justificando-o, compartilho com vocês a introdução (justificativa) da minha pesquisa que teve como tema O SIGAA E SUA INFLUÊNCIA NO DESEMPENHO ACADÊMICO DO ALUNO DO CURSO NOTURNO DE PEDAGOGIA.
Introdução

Vinda de outra instituição tive de aguardar o processo de aproveitamento de disciplinas para matricular-me no semestre 2013.1, o que fez com que perdesse a primeira semana de aulas. Na própria coordenação do curso de Pedagogia fiz o meu cadastro no Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas, mais conhecido como SIGAA, sendo informada que através daquela inscrição poderia gerenciar minhas matrículas nos semestres seguintes.
Logo que pude, acessei o sistema para conhecê-lo e ver que informações e possibilidades o mesmo me traria. No primeiro momento fiquei encantada com todas as atividades que poderiam ser desenvolvidas no SIGAA.
Observei que as disciplinas nas quais havia me matriculado estavam dispostas nos sistema com seus respectivos docentes, alunos, endereços eletrônicos e espaços para registros de atividades, enquetes, enfim, um ambiente virtual de comunicação entre afins.
Como mencionei anteriormente, iniciei meus estudos no semestre depois do início das aulas e pude obter informações sobre as aulas ministradas as quais não pude comparecer. Achei fantástico! Havia atualizações das disciplinas de Antropologia da Educação e Avaliação do Ensino e Aprendizagem, com orientações sobre atividades  desenvolvidas, incluindo textos utilizados e até mesmo informações sobre o andamento das aulas como horários a serem cumpridos e cronogramas. Senti-me mais inserida no contexto pois além do atraso na  matrícula, não fazia parte da instituição, o que dificultava ainda mais a minha comunicação com outros membros da turma.
Com o objetivo de aproveitar da melhor maneira as disciplinas do semestre, coloquei como hábito diário acessar o SIGAA, observando-o através do email, para acompanhar de maneira mais efetiva as informações e atividades desenvolvidas. Percebi então que a adesão do corpo docente era mínima. Das cinco disciplinas que tinha acesso, apenas uma professora atualizava as informações, com cronogramas, textos trabalhados e atividades propostas. Três das cinco disciplinas observadas não apresentavam nenhuma postagem, o que por consequência prejudicava o meu desempenho no que se referia ao acesso às informações das aulas.
Comecei a questionar-me sobre a utilização do SIGAA. Observei que o meu interesse, organização, assiduidade, dentre outros aspectos eram mais efetivos nas disciplinas nas quais a comunicação se estabelecia também através do SIGAA. Por ser estudante de um curso noturno, a possibilidade e facilidade de acesso à informação de forma mais flexível são extremamente valiosas.
Diante dessas constatações pessoais, gostaria de estender meus questionamentos a outros estudantes do Curso de Pedagogia noturno da FACED, buscando saber de que forma as atualizações das disciplinas no SIGAA influenciam (negativa ou positivamente) seus desempenhos acadêmicos.

Outro questionamento importante: Por que apenas a minoria dos professores da FACED utiliza o sistema? A coordenação/direção da faculdade observa as atualizações? Questionamentos feitos nos espaços destinados no sistema não são respondidos por nenhum membro da coordenação. Quem são os responsáveis pela gestão do sistema? Por que tantas falhas?

A partir destes questionamentos muitos outros surgiram. Temos um campo de observação imenso na nossa frente: a Faculdade de Educação. Repleta de pessoas diferentes, atitudes iguais..., concepções divergentes, olhares, dizeres...Observemos!

Desejo a todos um bom trabalho! 

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Recados do SIGAA

Hoje daremos início a uma nova seção aqui no blog: RECADOS DO SIGAA. Todas as comunicações via SIGAA serão postadas e atualizadas no blog, sendo mais um espaço para comunicação e interatividade durante o curso da disciplina de Antropologia da Educação. Fiquem de olho!

(Mensagem postada no dia 15 de setembro no SIGAA. Para aqueles que  não viram a mensagem no sistema e não fizeram o trabalho proposto, ele poderá ser feito em sala, durante a aula de hoje, sendo enviado até a próxima quarta-feira!)


15 de setembro de 2013
Boa tarde!

Como vocês viram, envolvemo-nos demasiadamente com a discussão sobre as possíveis questões sobre as quais desenvolverão suas pesquisas e acabamos por não concluir a discussão sobre o texto de Roberto C de Oliveira. Não se preocupem: concluiremos na próxima aula... mas sei que voltaremos aos seus ensinamentos outras vezes.

Escrevo agora também para apresentar os textos a serem discutidos na próxima semana. Não se assustem com a quantidade: são três textos que lerão muito mais rápido do que as primeiras páginas do texto de Roberto C de Oliveira.

Desta vez, não precisarão escrever resumos, como têm feito. Peço que escrevam uma ou duas páginas sobre o tema ou temas sobre os quais gostariam de desenvolver a pesquisa etnográfica. Para que questões essa experiência de ensino superior tem despertado vocês? O que têm observado sobre a universidade pública a partir da experiência na FACED? A leitura dos três textos, abaixo indicados, lhes ajudará a refletir sobre os seus diários de campo e, tenho certeza, também ajudará a despertar a criatividade... TODOS os textos abaixo estão disponíveis online. E o de Gilberto Velho está também disponível na xerox de Marcelo.

MAGNANI, José Guilherme Cantor. O velho e bom caderno de campo. Sexta Feira, São Paulo v. 01, n. 01, p. 8-11, 1997. 
VALLADARES, Lícia. Os dez mandamentos da observação participante. Rev. Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo v. 22, n. 63, 2007.
VELHO, Gilberto. Observando o Familiar in Individualismo e Cultura: Notas para uma Antropologia da Sociedade Contemporânea. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1999.

Abraço e aproveitem bem o resto do domingo!

Links de acesso:

Até breve!







domingo, 15 de setembro de 2013

As metamorfoses da experiência etnográfica



Quando eu estava pesquisando os brasileiros em Los Angeles, conheci Adair, um enfermeiro adventista com quem aprendi sobre a Bíblia, medicina alternativa, comida natural e várias outras coisas. Certa tarde eu estava em casa, olhando os desenhos das “Cartas do Caminho Sagrado”, de Jamie Sams, guru indígena americana, quando Adair bateu na minha porta.

Ao ver as cartas espalhadas sobre a minha mesa de jantar e observar que se assemelhavam às cartas de Tarot, ele me repreendeu dizendo que a Bíblia condenava aqueles que recorriam a esses oráculos. Como já nos conhecíamos há mais de dois anos, eu lhe perguntei se ele duvidava da minha sinceridade, do meu caráter e se realmente achava que a curiosidade pelo mundo além do consentido pelo cristianismo deveria ser punida nos mesmos termos de Deus contra Eva, por ela ter ousado experimentar o fruto proibido.

Ele refletiu e disse que não. Expliquei o sentido das cartas e daquele baralho. Não atentavam de nenhum modo contra o Deus cristão ou os seus ensinamentos. Naquela conversa, Adair se deu conta de que a exclusividade exigida pelas religiões é semelhante àquela exigida pela monogamia: receiam que as descobertas produzam metamorfoses… Dividam a atenção… Mas não é verdade que o conhecimento leva necessariamente à perda do paraíso, à ganância, à miséria… Ao contrário, o conhecimento é o único remédio contra a ignorância que, esta sim, como dizia o antropólogo Eric Wolf, é irmã gêmea da desgraça, do preconceito, do ódio e da intolerância...

Aprender quase sempre implica em se transformar… Desse modo, aprofundar o conhecimento sobre nós mesmos e o mundo que nos rodeia representa um enorme risco… Uma viagem sem volta, como a da própria vida. O empenho no exercício da atenção a nós e ao “outro” cria possibilidades extraordinárias e nos permite perceber que o “outro” não pode adivinhar o que queremos ou pensamos… Não é disto que fala Ferreira Gullar no poema abaixo?

TRADUZIR-SE

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.
Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.
Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.
Traduzir-se uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?


Sendo todos nós um pouco enigmáticos, precisamos nos observar e também às palavras que usamos… Domá-las, recriá-las… Como nos relacionamos com elas? Que sentido a nossa história lhes deu?  Que outros tantos sentidos cada história individual lhes dá? Este exercício nos tornará mais tolerantes, tanto com nós mesmos como com os outros… Mais humildes, atenciosos e gentis… Não é um risco que vale a pena correr?


Bernadete Beserra - Fortaleza, 15 de setembro, 19:30h.